A Carta de Helena

ㅤㅤ Neste sábado, Helena escreveu uma carta
ㅤㅤ Eu a recebi, como se estivesse recebendo a Deus
ㅤㅤ Olhei para aquela envelope, amarelado e com uma fita fazendo o seu contorno
ㅤㅤ Próprio de Helena, o amarelo e o vermelhor. As cores que representavam a sua vida


ㅤㅤ O sorriro presente em minha face
ㅤㅤ A curiosidade notavel em minha expressão
ㅤㅤ Logo então, abri a carta,
ㅤㅤ analisando o seu conteudo


ㅤㅤ Letre de forma, caneta preta utilizada e as consoantes num péssimo estado
ㅤㅤ As vogais, bem tratadas
ㅤㅤ A carta de Helana, bem escrita

ㅤㅤ A ponta de meus lábios erguidas
ㅤㅤEu a li

ㅤㅤ ㅤㅤ"Querido, John.
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤEu escreo a você, tentando da forma mais plausivel, expressar-me
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤEstá sendo dificil para mim.
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤConvivi ao seu lado. Todo esse tempo.
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤAfirmo, que foram os melhores momentos
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤMas. . .
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤO outro lado falou mais alto, e parece estar sendo incontrolavel
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤVocê é o único que me entende, e o único que sabe pelo que passei
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤTomei decisões. Sei que são imperdoaveis
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤMas. . .
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤFoi a única forma que encontrei de livrar-me
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤDeste sofrimento todo
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤDesta armagura"

ㅤㅤ ㅤㅤㅤㅤ "Eu suicidei-me
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Eu suicidei-me
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Eu suicidei-me
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Eu suicidei-me"

ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ "Entenda-me, eu pesso
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Entenda-me, eu imploro!"


ㅤㅤ ㅤㅤO sorriso escapou-me da face
ㅤㅤ ㅤㅤMinhas mãos, e dedos, tornaram-se
ㅤㅤ ㅤㅤTrêmulas

ㅤㅤ ㅤㅤA expressão, que antes herdei
ㅤㅤ ㅤㅤFoi derrotada pela do medo
ㅤㅤ ㅤㅤMeu olhos, vagaram pelas últimas linhas
ㅤㅤ ㅤㅤOs pensamentos, na procura da aceitação



ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ "És tão dificil para, mas entenda

ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Enquanto você lê
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ A decisão fora tomada, e feita
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Queria poder estar ao seu lado agora

ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Para lhe dar um abraço de consolação
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ E um de despedida
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Não preocupe-se com isso
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Meu espirito está agora o abraçando
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Consegue sentir?
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Lembra-se de minha pele macia?
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ E também dos meus cabelos sedosos?

ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Sinceramente, espero que sim
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Não se se consegue sentir-me agora

ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Mas. . .
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Eu consigo sentir você, John"



ㅤㅤ ㅤㅤ Sentir, eu não conseguia mesmo
ㅤㅤ ㅤㅤ Mas sabia que Helena estava ali

ㅤㅤ ㅤㅤ Dando-me um confortavel abraço
ㅤㅤ ㅤㅤ Me afofando, da forma mais graciosa

ㅤㅤ ㅤㅤ Dos meus olhos, desceram lágrimas
ㅤㅤ ㅤㅤ As mais marcantes de minha vida

ㅤㅤ ㅤㅤ Meu rosto parecia queimar, conforme escorriam

ㅤㅤ ㅤㅤ Fui para a última linha, nas suas últimas palavras escritas neste mundo



ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ "Eu pesso só uma coisa
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Pare de chorar. Não quero vê-lo assim"

ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ Com afeto: Helena

Charlize - Episódio 1x1 - Eu não sou a única

ㅤㅤ Sobre a cabeceira, algo se moveu produzindo um som agudo que acordaria a qualquer um que ousasse estar próximo. A emissão do barulho que o despertador produziu atingiu os ouvidos de Charlize e a fez saltar do doce mundo dos sonhos, um em que se sentia maravilhosamente bem, para a hipocrisia da realidade.
ㅤㅤ Os seus olhos não pesaram, como de costume. A adolescente não encontrou nenhuma dificuldade para deixar os seus olhos bem abertos para a clareza que seu quarto reluzia. Na pequena extremidade sul a sua escrivaninha de marfim apresentou-se escondida em meio a dezenas de caixas de mudanças, onde objetos escolares, peças de roupas sujas e aparelhos domésticos saltavam para fora por estarem tão cheias. O seu guarda roupa não foi nenhuma exceção; as portas deslizáveis estavam abertas e exibiam a confusão de roupas e objetos eletrônicos enrolados como se fossem um só, parecendo se tornarem algum tipo de objeto desconhecido. Ao enviar um rápido comando aos seus olhos, que não hesitaram em obedecê-la, Charlize viu-se numa repleta emudeci. Sua mãe a obrigaria a organizar todos aqueles objetos em peças de roupa com uma mão apenas; poderia até imaginar o trabalho que teria. Mas Charlize tinha os seus próprios modos e este sempre se mostrou bem eficaz diante de certas situações.
Para não perder a prática, ela bocejou. Um gesto que durou longos segundos, tempo o suficiente para dispersar a sua preguiça. Os seus braços se ergueram por alguns instantes e logo desabaram sobre aquele colchão macio; deu algumas apalpadas para que desfrutasse da maciez. Por último, um suspiro soou por todo o quarto, e aquele movimento pareceu surtir efeito em praticamente tudo a sua volta.
ㅤㅤ Deu-se inicio ao seu processo eficaz e prático.
ㅤㅤ Os seus pensamentos pareceram ficar mais soltos e leves, como se fossem plumas pousando em seus cabelos; os seus problemas do dia-a-dia já não pesavam mais tanto assim. Não como antes. E, então, as roupas antes entrelaçadas e enroscadas nos objetos eletrônicos se soltaram como se algo ou alguma coisa invisível os soltassem, mas as ordens vieram da cabeça de Charlize, de seus mais profundos pensamentos. De seu “ser”.
ㅤㅤ A porta do guarda-roupa deslizou, dessa vez para fechá-lo, e assim manter pressas as roupas dentro de seu móvel. Os objetos permaneceram flutuando no ar; a primeira vista podia-se jurar que linhas invisíveis de nylon estariam a segura-las, mas a força dos pensamentos de Charlize desmentiam aquela hipótese. As caixas de mudanças, que foram colocadas em seu quarto na noite passada, começaram a se movimentar e dispararam para um canto vazio do quarto, assim se colocando uma sobre a outra e formando pequenas pilhas que, por cautela e raciocínio, estabeleceram um ótimo equilíbrio.
ㅤㅤ A escrivaninha finalmente se apresentou ao se livrar daquelas caixas de mudança; sobre ela se mantinha um laptop branco com uma aparência antiquada, se deparavam arranhões em sua superfície, marca de dedos sobre a tela e as letras desenhadas nos teclados pareciam invisíveis ao estado em que se encontravam.
ㅤㅤ Charlize sorriu, apenas. Ordenou que os objetos eletrônicos se posicionassem sobre a escrivaninha e assim eles a obedeceram como ótimos servos. Por algum momento, uma ligeira questão de tempo, a adolescente permaneceu com os olhos fechados; a sensação de poder que sentia dentro dela parecia querer se expelir para fora do seu corpo, a ponto de destruir completamente tudo a sua volta. Charlize se concentrou e manteve aquele desejo ali dentro, aprisionado. Suspirou, agora sentindo-se livre daquela sensação, e saltou de seu colchão, pondo a amostra o seu pijama rendado de um tom roxo púrpuro. Dirigiu-se até o espelho em seguida, em que suas vistas receberam imagens de seus longos cabelos negros despenteados. Se não conhecesse a si mesmo, Charlize poderia jurar que levaria um susto naquele momento, mas, como era de costume levantar com o aquele naquele estado, ela simplesmente deu de ombros, sem se importar com a situação.
ㅤㅤ O que a deixou escalpelada, foi o fato de avistar cadernos e livros posicionados ao lado do guarda roupa. É o primeiro dia de aula, sussurrou para si mesma, num desanimo bem notável pela sua expressão decaída e o rosto flácido.

ㅤㅤ Da cozinha, pode-se ouvir claramente o som de passos lentos e fortes descendo as escadas, e a mãe de Charlize, Vera, contestou que o começo daquela manhã não estaria a alegrar a sua única filha.
ㅤㅤ Vera esperou paciente a chegada de sua filha a cozinha, que, com certeza, não seria nada triunfal e sim desanimador, a ponto de deixar o clima emocional despencar a algo bem angustiante. A porta esbranquiçada da cozinha, que apresentava pequenas rachaduras em sua extremidade, abriu-se lentamente, dando passagem uma adolescente com uma expressão de desanimo estampada em seu rosto jovial.
- Algo de errado hoje, querida? -Perguntou a sua mãe, com aquela voz doce, na esperança que animasse a sua filha. Mas ela mesma sabia que aquilo não adiantaria.
- Eu preciso responder - Ocorreu uma pequena pausa. – Acho que não.
ㅤㅤ Charlize caminhou até a mesa, dali vislumbrando, sobre aquela superfície plana, deliciosos pratos com bolachas, ovos cozidos e fatias de pão e o longo da mobília se estendiam jarras de suco. Tudo obra de sua mãe para que a alegrasse. Infelizmente, Vera não conseguira arrancar um sorriso de Charlize.
- Filha... – Começou Vera, se posicionando ao lado de seu tesouro. - ... Todos nós sabemos que o primeiro dia de aula numa escola diferente é difícil. Você com certeza vai superar.
ㅤㅤ Charlize retrucou, num tom áspero.
- Não é o problema da escola ser diferente, e sim de eu ser diferente, mamãe. Será que você não consegue entender isto?
ㅤㅤ Vera suspirou, profundamente. Sabia á que sua filha se referia ao mencionar sobre ser diferente. Poderia argumentar em seus pensamentos de que nenhuma outra mãe no mundo haveria dado conselhos a uma filha diferente dos outros adolescentes, mas diferente de um modo meio anormal e não considerável pelos olhos de muitos.
ㅤㅤ No final das contas, Vera nunca sabia o que dizer para animar a sua filha.
- Bom, eu tentei. – Se esticou e colou os lábios no rosto de sua filha e a beijou, em seguida se afastando, se locomovendo para a pia, onde adiantou-se e enxugou alguns pratos.
Charlize não se chateou por não ter recebido conselhos ou alguma ajuda emocional de sua mãe. Sabia que ninguém poderia ajudá-la a enfrentar o medo dos outros vê-la como uma “aberração”

ㅤㅤ De olhos fechados, ela pode respirar o delicioso aroma que a natureza trazia para aquela lado da cidade; um cheiro que era levado pelos ventos ao baterem nas folhas das copas das árvores. Por estar com os olhos fechados, Charlize desejou não poder ouvir mais nada – o som angustiante de pessoas reclamando, brigando entre si e tendo conversas intoleráveis, tornava o ambiente melancólico. Algo que não a alegrava.
ㅤㅤ De olhos abertos, ela vislumbrou uma vizinha de aparência rústica, com casas no mesmo formato arquitetônico, mas com pinturas e destaques diferentes dos vizinhos. O Valle dos bons espíritos localizava-se numa parte estratégica da cidade; onde apenas um ônibus fretado passava por aqueles arredores, e também um ônibus escolar. O ambiente parecia ser calmo e hospitaleiro, mas aquela percepção era rapidamente quebrada ao ouvir as constantes brigas familiares que rodeavam aquelas casas. Pobres famílias, sempre vivendo em dificuldades.
O sol se estendia sorrateiramente pelo sul, parecendo constrangido por se esconder atrás de algumas nuvens que, por estarem num tom cinza escuro, aparentavam anunciar uma chuva no fim de tarde. Cada raio de luz que ele emitia parecia dar vida a aquela solo morto e com uma grama num tom verde desbotado. Charlize simplesmente sorrio ao sentir aqueles feixes de luze solar tocar-lhe o corpo. Era uma sensação agradável, que fortificava o seu espírito de uma forma exuberante e encantadora. Se não fosse pelo fato de ser o seu primeiro dia de aula e por enfrentar algumas conseqüências, Charlize poderia se encontrar de paz com a sua vida. Mas sempre há um lado negativo. Em tudo!
ㅤㅤ A mochila já permanecia ajeitada em suas costas. Dentro dela, cadernos, um estojo com os mais variados tipos de lápis e canetas, livros didáticos e alguns objetos de cálculos geométricos. Ela estufou o peito e exalou um longo suspiro, que a principio pareceu ser emitido para acalmar o seu ser. Começou a dispersar seu olhos para as casas vizinhas, onde adolescentes, mais ou menos de sua idade, saiam de suas casas acompanhados com suas mochilas; ambos preparados para o seu dia de aula. Alguns carregavam sorrisos bobos no rosto, por estarem extasiados e animados por saberem quais novidades os aguardariam este ano. Outros davam risadas com seus amigos, com que na qual não os vinham a tempo. Alguns seguiam seus caminhos pela longa calçada iluminada pelos raios solares – onde as sombras das folhas eram projetadas perfeitamente sobre a sua superfície – e a maioria carregavam expressões neutras. Estes sabiam o que os aguardariam, o que enfrentariam e o que haveria de novo para se suportar.
ㅤㅤ Já tendo despedindo-se de sua mãe, Charlize ajeitou a mochila começou a seguir o seu caminho. Pela aglomeração de adolescentes, qualquer um poderia jurar que um estaria a seguir o outro, mas estaria completamente errado. Ambos iam em direção ao lugar onde aguardariam o ônibus escolar.
ㅤㅤ Charlize abaixou a sua cabeça, tentando evitar olhares curiosos que cresciam em sua direção. Era nova na cidade, nova na região, por isso algumas pessoas passaram a olhá-la; praticamente surgiam comentários sobre como ela devia ser, o seu jeito. A maioria dos comentários eram críticos em respeito ao seu jeito de vestir-se: calças longas, roxas e amarrotadas; uma blusa com manga que lhe cobria até as mãos e por baixo uma camiseta branca com uma gola que lhe atingia até a altura do pescoço. Seus cabelos, negros e macios, estavam amarrados no estilo rabo-de-cavalo, supostamente para evitar o vento e a precaução para que eles se esvoaçarem. O jeito de vestir-se de Charlize parecia ser brega, mas cada um com o seu estilo.
ㅤㅤ Charlize começou a ouvir aqueles comentários mais claramente, e tornou a abaixar um pouco a cabeça na tentativa de evitar aqueles olhares. Tentou direcionar pensamentos para seus outro local, antes que aquelas vozes a levariam na loucura. Charlize mostrou-se teimosa e utilizou o seu dom para abrir a sua mente e deixou com que pequenos fiapos de fumaça, quase que transparentes, invadissem a cabeça das pessoas. Queria ouvir o que elas realmente pensavam. O que realmente achavam da nova moradora.
ㅤㅤ Um silêncio predominou ao desligar-se do mundo. O seu corpo ainda mantinha os passos, por contra própria. Charlize apenas focou-se nas vozes que começaram a surgir, a partir de sussurros.
ㅤㅤ “Como ela tem coragem de vir com uma roupa assim para a escola?” “Urgh. Que nojo” “Aluna nova, com o tempo ela toma vergonha e vem com algo mais decente” “O cabelo dela é lindo, mas a roupa” “Essa daí tem cara de maluca. Com certeza não vai durar dois dias na escola”.
As vozes pareceram ficar mais altas e começaram a tomar conta de sua cabeça. Começaram a se amontoar e todos pareciam falar ao mesmo tempo, mais alto. Cada vez mais alto! Estava sendo insuportável!
- CHEGA! – Ela gritou; o seu rosto herdando traços de raiva e ódio.
ㅤㅤ O tom de sua voz pareceu alcançar o ouvido de todos e uma forte brisa se propagou pelo local ao som de sua voz parar de ecoar pelo mais terreno gramado. Os longos cabelos que algumas garotas tinham se ergueram ao sentir aquela brisa e, como se fosse em um filme, desceram em câmera lenta. Os meninos olharam assustados para os cabelos das garotas que ao seu lado estavam. Sacudiam a cabeça incansavelmente, querendo não acreditar no que ocorreu.
ㅤㅤ Charlize sabia das conseqüências que lhe causariam ao invadir a mente de tantas pessoas ao mesmo tempo. Ela não havia treinado para manter aqueles pensamentos num lugar e assim passar a controlá-los. Teria muito o que praticar. Mas o estrago já estava feito.
ㅤㅤ Com o passar dos segundos, ela foi-se acalmando. A raiva e o ódio se dispersou ao sol perder a timidez e mostrar por completo a sua grandeza. Aquelas luzes atingiram Charlize e a fez ceder; acalmar-se. Retornou ao mundo real e agora passou a comandar os seus passos. De cabeça ainda baixo, alguns fios de seus cabelos negros passaram a cair e a tampar ao pouco a visão de seu rosto. Começou a se arrepender de seu erro. No primeiro dia de aula as pessoas começariam a desconfiar de sua anormalidade.
ㅤㅤ Os alunos voltaram a caminhar, agora com passos bem mais largos; demonstravam-se com medo de presenciarem novamente uma cena como a anterior. Todos se movimentaram, para o mais longe possível de Charlize, parecendo formarem um circulo em sua volta.
Uma pessoa, atreveu-se e adentrou naquela circulo da solidão.
- Como você fez isso? - Perguntou. Uma voz feminina, com uma afinidade bem leve.
Charlize assustou-se. Primeiramente por alguém ter vindo falar com ela e depois pela pergunta que seus ouvidos receberam.
ㅤㅤ Ela não desejou responder. Continuou com o seu caminho.
ㅤㅤ A menina, persistente, insistiu dando inicio a uma apresentação amistosa.
- Prazer. Me chamo Brenda. Brenda Tavares.
ㅤㅤ Aquela voz, tão doce, mais quanto o açúcar, pareceu chamar a atenção de Charlize.
ㅤㅤ Demorou alguns segundos, e acabou retribuindo a apresentação.
- Charlize. Mudei-me para cá a pouco tempo. – Sua voz soou melancólica, e quase que inaudível.
ㅤㅤ Brenda pareceu feliz por Charlize ter-se apresentado e escolheu prolongar o assunto, assim retornando com a pergunta anterior.
- Então. Como você fez isso?
Charlize tentou se esquivar.
- Isso o que? Eu apenas gritei.
- Bom, não foi exatamente isso que eu vi... Se quer que eu especifique, vamos lá. Quero que me responda como propagou aquela brisa e como fez para que os cabelos daquelas mocreias caíssem tão devagar?
ㅤㅤ Charlize riu ao Brenda referir aquelas garotas implicantes utilizado o nome “mocreia”. Aquilo fez com que uma ponta de confiança despertasse entre as duas. Então, Charlize respondeu, trazendo junto a si a sinceridade.
- Aquilo foi uma demonstração de ódio. E eu nunca soube controlar, sabe? Sou muito teimosa em utilizar esse meu dom. Mas, nem ligue. Você deve me achar uma louca por estar falando isso. Mas, se não acredite, bote em sua cabeça de que aquilo foi apenas uma mera ilusão causada pela luz do sol e por uma pequena alteração do vento.
ㅤㅤ Agora fora a vez de Brenda da risada. Ela cessou em seguida, agora parecendo bem séria.
- Eu acredito em você. Afinal, parecemos ter o mesmo “problema”.
ㅤㅤ Charlize não entendeu de inicio. Foi só erguer um pouco a sua cabeça e deslumbrar aquelas mãos femininas, com unhas pintadas num tom leve de rosa - choque, que a resposta lhe veio a cabeça.
ㅤㅤ Da mão de Brenda, pequenos cristais de gelo moviam-se entre seus dedos. Pareciam pequenos asteróides brilhantes , que criavam uma brilho azul turquesa pela pele de Brenda. Pareciam ser tão suaves, mas as suas pontas representam o perigo.
ㅤㅤ Eu não sou a única, pensou Charlize. Um sorriso amistoso formou-se em seu rosto.

Poema - Depois de fechar os olhos


ㅤㅤ Os olhos, eu fechei, deslumbrando, por fim, o breu
E foi mais uma vez
Que eu sofri de um ataque de Morfeu

Manchas roxas, eu vi, em poucos segundos
Elas dançavam para mim
Enquanto permanecia ligado, perante os dois mundos

Dançarinas, criavam formas esquisitas
Meu cérebro, trabalhava pouco para conseguir
distingui-las

Decidi, esperar, relaxei-me
na esperança, que mostrassem algo, elas

Acabou-se, então, a espera,
do outro lado
me sentia isolado dentro de uma esfera

Meus olhos, remexiam-se por debaixo das pálpebras
Um sorriso, estendeu-se em meus lábios
Da escuridão, surgiram homens, vários

Debandou-se o meu sorriso, para a terra do amanhecer

Ocorreste a aproximação
Em meu corpo, sentia algo quente escorrer

A partir de um calor, senti o temível medo
Homens, rudes e hipócritas
Desejei que tudo, novamente, se tornasse preto

Desbravaram ofensas, perante a mim
Levaste tempo para que eu percebesse que aquelas
palavras, dirigidas, fosse para o meu ser
Isto fez-me ceder

Decai-me, sobre aquele chão escuro e sem força
Palavras, que levaram meu cérebro a um formigamento intenso
Pareci morrer, diante daquele mundo imenso

" - Sentir pena de você? Ó. Que comédia! - " Debochou um deles
O sofrimento pareceu real, bem vivido
Margens dos meus sentimentos não se mostravam
mais límpidos

Queimava e tremia, o meu corpo
Cabisbaixo, eu me encontrava
As minhas lágrimas, derramavam-se para um deformado
poço

Já não queria mais, eu, dormir,
amaldiçoou Morfeu
fez dos meus sonhos, um mundo, que faz questão de
me redimir

" - Acorde! Acorde! - ", eu sussurrava para mim mesmo
foi difícil, abrir meus olhos, escapar daquelas ofensas
árduas

Os meus olhos, eu abri, deslumbrando cores vivas
e, por mas uma vez, percebi que,
em nenhum daqueles mundos
poderei escapar da tolerância do ser humano

Os olhos, tornei a fechar, dizendo a mim mesmo
" - Talvez a morte, uma hora, resolva - "
O sono, não tardou a chegar, e fui em busca de ajuda,
desta vez,
em meus mais profundos pensamentos

Poema - Morte

ㅤㅤ Através das colinas, das mais sombrias
ㅤㅤ Ela se encontra, esperando por mim
ㅤㅤ Em todas aquelas noites frias

ㅤㅤ Seu nome? Foi o meu desejo saber
ㅤㅤ Sua aparência? Meus olhos nunca puderam ver
ㅤㅤ Mas, eu consigo senti-la
ㅤㅤ Todos os dias
ㅤㅤ Desfrutando de minhas magoas
ㅤㅤ Navegando em minhas lágrimas, relaxando em meus mais profundos sentimentos
ㅤㅤ Aguardando o momento, em que apagarei meus pensamentos

ㅤㅤ Dormir, quase nunca tinha chance
ㅤㅤ Sua respiração em meu cangote, faziam-me entrar em transe
ㅤㅤ Meus olhos,bem abertos
ㅤㅤ Minha respiração, ávida pela liberdade
ㅤㅤ E ela lá! Sem demonstrar muita intimidade

ㅤㅤ Emoções. Emoções. Eu não conseguia controla-las
ㅤㅤ Mostravam-se ferozes, queriam fugir
ㅤㅤ Mas ela não deixava, brincava comigo. Com todos!

ㅤㅤ Todos a vêem sobre um cavalo, acompanhada com três amigos
ㅤㅤ Uns a detestam, por ela ter tornado seus dias sofridos
ㅤㅤ As chamam de morte


Escrito por: Victor Hugo Bollari

Charlize - Prológo


ㅤㅤ Não podia jurar estar em algum lugar terrestre ou espiritual. A princípio, eu não sentia nada; meus sentimentos, minhas emoções, ambas pareceram irem para fora do meu corpo, do meu espírito. Nada mais me restava a não ser aguardar por algum milagre divino ou alguma ajuda celestial. Mas a fé nunca fez parte de meu “ser”
ㅤㅤ Meus olhos se encontravam fechados, cara a cara com a densa escuridão que a minha visão produzia diante de minhas pálpebras fechadas. De vez em quando, eu conseguia ver feixes arroxeados sendo produzido por algo através de meus olhos. Estas manchas pareciam se modelar ao forçar algo indistinto em minha mente, e assumia formas de pessoas corpulentas que pareciam vir em minha direção, mas não podiam me alcançar de jeito nenhum. Algo dentro de mim parecia bloquear o caminho maldoso que elas estariam a seguir.
ㅤㅤ Fiquei feliz, por não tê-las por perto.
ㅤㅤ Naquele exato momento, eu parecia pousar sobre algo. Os meus pés tocaram algo solido e o que parecia de estatura plana e cheguei a sentir algumas rachaduras. Em seguida, desejei reconhecer o local. E sem, sequer, abrir os meus olhos, veio á minha mente algo que eu reconhecia por ter presenciado várias vezes em algumas das aulas de história em minha moderna escola. Os feixes arroxeados criaram uma superfície plana abaixo de mim e adiante se materializou um dos maiores transportes do mundo, que continha polpa e proa. Os navios pareciam enormes e seus tamanhos eram incalculáveis a distancia em que eu os enxergava. Encostado a eles, se distinguiam estruturas de metal de um tamanho colossal que, infelizmente, também não consegui reconhecer; a minha memória não estaria a funcionar bem naquele momento de profunda tristeza.
ㅤㅤ Me encontrava em um porto de navios. Mas não sabia especificamente a minha localização. Naquele ponto, eu poderia estar em qualquer lugar do mundo...
Comecei a ouvir sons abafados, que foram se aguçando conforme o ponteiro do relógio se movimentava. Primeiro, escutei aquele adorável som que o mar produzia aos navios se movimentarem sobre ele; algo totalmente gostoso de se ouvir para tranqüilizar a sua mente. E bem que a minha precisava de um pouco de paz... O segundo som foi o que me causou uma sensação de pânico. Um arroxeado bem extenso se formou entre aqueles seres corpulentos que ainda tentavam vir em minha direção, mas sem sucesso algum. E, então, percebi que era uma explosão. Aquele estrondo invadiu meus ouvidos; meus tipanos se tremeram para se manifestarem do forte som que acabara de os atingir.
ㅤㅤ Não sei se havia calculado mal, mas, aquelas pessoas, aquela explosão, parecia ser tudo culpa minha. E o meu subconsciente me declarava culpada daqueles acontecimentos atuais.
Não podia! Eu já havia sofrido demais até aquele ponto. Não podia me sentir mais culpada de nada. Aquilo se tornou um sofrimento real, e mais um peso em minha consciência. Isso vai me levar a loucura!
ㅤㅤ Eu gritei. O som do meu grito pareceu se propagar por uma grande área em volta daquele porto. Tornou-se mais agudo para que a minha raiva se manifestasse da forma mais horrível que eu pudesse imaginar. Mas eu não importava se aquilo fosse machucar alguém próximo a mim. Eu queria me livrar daquela dor. O mais rápido possível.
ㅤㅤ Criei coragem, uma sensação que não havia sentido a um bom tempo atrás. A luz do sol irrompeu sobre os meus olhos e levou algum tempo para que a minha visão se acostumasse e tomasse conhecimento do lugar. Ainda era o mesmo porto de antes, mas agora as suas cores eram mais vivas. Pude notar que aqueles seres corpulentos eram soldados com uniformes camuflados de algum exercito secreto. O inacreditável é que eles continuavam vindo em minha direção, mas um tipo de campo de força os impedia de prosseguir.
ㅤㅤ Os meus gritos continuarem e eu puxava uma energia para o meu corpo e esta se dispersava ao mesmo tempo. Me sentia melhor por aquela sensação, mas sempre há um preço. As estruturas de metais de tamanho colossal começaram a despencar. O seu metal se torceu como papel molhado e se elevou ao chão em poucos instantes. O impacto foi tão forte que o chão estremeceu e outras estruturas levaram-se a desabar.
ㅤㅤ A sensação da maldade. Parecia ser tão boa, tão desejável para mim que eu não hesitei em prosseguir. Mas um peso sobre o meu ombro me fez parar. Eu me virei e vislumbrei uma mão, masculina, com um anel dourado e reluzente perante a luz do sol.
Não podia acreditar. Ele veio.


Fim do Prólogo

Pensamento

A morte, ás vezes, pode ser mais justa do que a vida. A vida, como sua inimiga, não nos deixa pensar por esse lado. Apenas quando fechamos os olhos, a morte nos mostra a realidade e a justiça.

- Victor Hugo Bollari

Conto - O Cativeiro

ㅤㅤ Cinco dias. Cinco dias foram exatamente o tempo em que ela passou naquele cativeiro – vitima de um seqüestro relâmpago.
ㅤㅤ Não importava se fechava ou abria seus olhos, a escuridão não iria embora. Nem sua imaginação dava conta daquelas trevas. Era como estar cega. A venda posta sobre seus olhos, á exatamente cinco dias, tinha obscurecido a sua visão desde o dia em que ocorreu o seqüestro. A última imagem que presenciou foi à mão de um homem lhe tapar os olhos, vendo assim uma densa penumbra. Seguidos de longos choros de angustia, ela foi arrastada pelo homem até um carro; nem mesmo ela sabia onde estava indo, só sabia que estava em extremo perigo. Depois veio a venda. Ele a apertou com tanta violência no rosto dela que as veias de sua cabeça saltaram pela dificuldade na circulação do sangue. O homem a jogou na parte traseira do carro, onde ela emitia gritos de ajuda e, de vez em quando, implorava ao seqüestrador que a deixasse ir. Ele não ligou; aquelas palavras entravam por um ouvido e saiam pelo outro. Deu a partida no carro e foi para o seu destino, o cativeiro.
ㅤㅤ Jennifer não podia descrever como era o local, afinal, ela nunca o vira, pois seus olhos nada viam. Mas o seu corpo podia dar uma simples descrição do cativeiro: o chão era áspero com pedrinhas espalhadas em volta. Ao encostar-se na parede podia sentir canos de ferro e uma forte vibração vinda de seu interior – era água, e isso era notado pela umidade do local. Jennifer ouvia pingos caírem ao chão, formando pequenas poças. Parecia haver algum tipo de vazamento nos canos. Era impossível afirmar se havia luz no cativeiro, pois não havia nenhuma brecha em sua venda para notar algum feixe de luminosidade. Ele amarrou tão forte, sussurrava ela.
ㅤㅤ Acima de tudo, Jennifer não conseguia se mover para tentar se livrar da venda. Suas mãos foram amarradas firmemente em suas costas; suas pernas também se encontravam no mesmo estado. Caso ousasse a se mover, seus músculos se contorceriam e uma baita cãibra surgiria em seus braços e pernas. Jennifer desistiu de se livrar das cordas no terceiro dia, quando a dor não era mais suportável. Chegava a emitir um grito aterrorizador quando a cãibra chegava.
ㅤㅤ Os pingos de água eram as únicas coisas ouvidas naquele cativeiro durante os cinco dias em que Jennifer ficara ali. Havia até cronometrado o tempo em que cada gota demoraria a cair. Um, dois, três, quatro – a gota caia-, um, dois, três, quatro – outra gota caia-. Seus ouvidos começaram a se enlouquecer com o barulho repetitivo. Jennifer fazia qualquer coisa para ignorá-los. Cantarolava. Assobiava e até tirava uma soneca. Mas eles penetravam em seus sonhos, os fazendo virar um terrível pesadelo. Mas, calculando as circunstancias, haveria pesadelo pior que aquele?
ㅤㅤ O sexto dia chegou, e a fome fazia o estomago de Jennifer embrulhar-se e roncar sem intervalos. Sua boca estava seca, nem conseguia mais produzir saliva. A qualquer momento a morte poderia encontrar aquele cativeiro e levá-la para sempre. O que ele quer de mim?, ela se perguntava durante horas. Jennifer não sabia, mas aquele sexto dia seria o dia de sua liberdade; ou não.
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ - Olá!– Disse uma voz, ecoando pelas paredes. A voz veio mais duas vezes.
ㅤㅤ Um instinto de sobrevivência colidiu nos sentidos de Jennifer. Alguém veio salva-la daquele terrível lugar. Aqui!, ela gritou, Por favor!. Sua voz era fraca e rouca pela falta de liquido. Por um instante, Jennifer imaginou que o homem não tinha a ouvido, mas se enganou.
ㅤㅤ Depois de seis dias, ela ouviu uma coisa além das gotas caindo do teto: passos apressados e uma respiração pesada e lenta. Jennifer gemeu em forma de manifestação. Não tinha mais possibilidade de gritar, a falta de liquido chegou ao auge.
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ - Estou aqui, não se preocupe mais. – Disse a voz, mais audível. Era um homem. Jennifer argumentou a possibilidade.
ㅤㅤ Ao sentir o homem lhe tocar o corpo ela rapidamente se encolheu. É o seqüestrador, pensou. Mas não era. O homem viera até ali para salva-la. Jennifer botou sua confiança em andamento e afrouxou seu corpo. O estranho colocou a mão atrás de sua cabeça, retirando o nó da venda. Jennifer sentiu o sangue de sua cabeça circular agora com mais facilidade. Um alivio. Então, o homem retirou sua venda.
ㅤㅤ Primeiro viu um borrão, uma luz ofuscante atingir-lhe seus olhos. Piscou dezenas de vezes, esperando que o borrão fosse embora. O homem a sua frente parecia um desenho desmanchado. Conforme piscava, repetitivamente, Jennifer sentia sua visão voltar ao normal. O cativeiro era como imaginou, mas ali haviam luzes. Luzes fortes e ofuscantes. Só não conseguiu distinguir onde estava. Ao olhar para os cantos imaginou que ali fosse um sistema de esgoto. Mas havia outros locais que se pareciam como aquele onde se encontrava.
ㅤㅤ Em seguida, o homem tirou os nós das cordas que a amarravam e a libertou. Jennifer sentiu seu corpo livre. Seus braços e pernas ficaram moles por alguns instantes. Primeiro tinha que se acostumar com aquela posição; algo que não fazia á dias.
ㅤㅤ ㅤㅤ ㅤㅤ - Obrigada. – Foi á única coisa que disse e a única que lhe veio á cabeça. Tinha outras perguntas a serem feitas, mas aquela não era o momento.
ㅤㅤ O homem se levantou e deu sinal para que Jennifer o seguisse. Ela obedeceu e, ainda não acostumada com o fato de ter as mãos e pernas livres, o seguiu.
ㅤㅤ O longo túnel em que andavam era realmente como um esgoto. A água passava em meio ao túnel, numa espécie de buraco feito no chão. Jennifer começava contestar a idéia de que estava embaixo da terra, num esgoto; mas, ao olhar para cima, não viu nenhuma tampa que a deixasse ir para ruas. Foi uma pena. Se houvesse uma tampa ali, ela e o homem poderiam sair mais facilmente do cativeiro.
ㅤㅤ Entre as duas respirações, a do homem e de Jennifer, uma sairia vencedora: o homem. Ele aparentava estar mais tempo ali. Seu estado era simples de se descrever: magro, fraco, roupas rasgadas e o rosto sujo e suado. Seu estomago não roncava assim como o de Jennifer. Aparentemente ele havia se alimentando algumas horas atrás.
ㅤㅤ Alguns minutos se passaram e os dois pobre coitados notaram uma luz no final do túnel. Conforme se aproximavam, a luz e a saída do túnel iam ficando cada vez mais nítidos aos seus olhos cansados. Aceleraram os passos. Uma onda de alegria irrompeu sobre os dois. Jennifer sorriu depois de seis longos dias presa naquele cativeiro. O homem, por outro lado, conteve seu sorriso para quando se encontrasse livre. Sim, ele não gostava de se precipitar.
ㅤㅤ Nenhum dos dois esperava por mais nada a não ser ir de encontro com a luz e a liberdade, mas isso ainda não iria acontecer. Um homem cruzou um dos corredores que ficava interligado a saída e entrou em frente a ela. O sorriso de Jennifer desmoronou, como uma criança que tivesse recebido o presente de natal errado. Os dois pararam de correr. O seqüestrador continuava parado, bloqueando a saída do túnel. Ele usava uma roupa de açougueiro, coberta de sangue por todos os lados. Só Deus sabia os terríveis crimes que aquele homem cometeu em honra á um poder pagão.
ㅤㅤ O seqüestrador deu um passo para frente, em seguida outro; e outro. Sua intenção era alcançar os dois fugitivos. Não, ele disse, Hoje não. Jennifer e o homem deram meia volta e correram, ambos indo para direções diferentes. O homem entrou em um corredor mais próximo a ele, correndo loucamente para salvar a própria vida. Jennifer voltou o caminho todo, mas não voltou para o seu cativeiro – assim desejava o seqüestrador. Ela cruzou um outro corredor próximo onde ficava o seu cativeiro.
ㅤㅤ Este era mais luminoso, mas o cheiro de podre era notável. Seu corpo parecia ter ficado mais leve, isso pelo fato de sua adrenalina estar a ativa. Corria como nunca havia corrido antes. Não parou nem para olhar para trás. O túnel parecia acabar numa parede soterrada por pedras de vários tamanhos e formas; algo acima deles parecia ter causado aquele deslocamento. Ainda havia uma saída daquele túnel. Do lado esquerdo da parede, próximo ao final, havia uma porta dupla de madeira, idêntica as usadas em castelos medievais.
ㅤㅤ Antes de entrar por entre aquela porta, o que supostamente poderia ser sua saída para liberdade, ela ouviu um tiro e um gemido agonizante de um homem morrendo. Ele o matou, pensou ela. Empurrou a porta dupla, com um pouco de dificuldade por se pesada, e adentrou no local.
ㅤㅤ Não era nenhuma saída e nenhum outro túnel; era uma espécie de sala, mas uma sala bem desarrumada. O chão laminado era sujo. Sangue era visto pelas paredes e espalhados pelo chão, como se alguém não se importasse onde jogá-lo. Uma pequena mesa de cirurgiã se encontrava no final da sala; estava coberta de sangue, onde dezenas de pingos caiam das bordas. O som de pingos iria perseguir ela pela vida inteira. Mas aquilo era sangue pingando e não água. A cada gota que caia no chão, Jennifer podia ouvir uma alma chorando e outra pedindo por misericórdia. Não agüentava aquilo, não mais.
ㅤㅤ Caminhou pela sala e, quando se virou para o outro lado dela, foi que viu: uma pequena montanha de corpos humanos, mortos, e com algumas partes de seus corpos arrancados. O cheiro que sentiu foi indescritível. Um cheiro que seu nariz conseguiu suportar graças a adrenalina, mas foi diferente com o seu estômago. Jennifer curvou o corpo e vomitou. O pouco de liquido que seu corpo carregava saiu pela sua boca. Fraca, ela caiu de joelhos ao chão, em cima do seu vomito. Não achou nojento, nenhum pouco. Havia muito mais coisas nojentas a sua volta.
Um, dois, três, quatro – Uma gota de sangue caia de cima da mesa. Um, dois, três, quatro – ㅤㅤ Outra caia, como um choro de uma criança com medo do bicho papão.
ㅤㅤ Inesperadamente, algo pesadíssimo foi jogado sobre ela. O homem que estava ajudando a sair do cativeiro poderia ser magro e fraco, mas mesmo assim ele era bem pesado calculando a altura de que fosse jogado. Jennifer gemeu, de dor. O homem, morto, com um tiro nos pulmões, deslizou de cima do corpo de Jennifer e desabou ao lado. Jennifer voltou a ficar de joelhos, desnorteada. Ouviu passos, mas não ousou se virar. Seu instinto de sobrevivência e sua adrenalina falharam. Não sentia força nem para respirar. O seqüestrador ficou atrás dela, puxou seus cabelos e passou uma faca afiadíssima em seu pescoço.
ㅤㅤ Antes de pertencer a escuridão, Jennifer ouviu a voz diabólica do seqüestrador sussurrar em seu ouvido: Um, dois, três, quatro.


Fim.


Escrito por: Victor Hugo Bollari

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